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9.9.08

Foto e crônica de Maria Luiza Freire




A parente Maria Luiza de Almeida Prado Luna Freire envia sua colaboração para o blog: um retrato de família à esquerda, na qual aparece em companhia de seus filhos, e uma crônica de sua autoria.
Na imagem, tirada no Natal de 2007, estão da esquerda para a direita: Thiago de Almeida Prado Luna Freire Domingues; Maria Luiza de Almeida Prado Luna Freire; Luciana de Almeida Prado Luna Freire Domingues e Rafael de Almeida Prado Luna Freire Domingues.(filha e netos de Maria Antonia de almeida Prado Luna Freire - Toninha -)
Com a palavra, a própria Maria Luiza:

"Queridos primos
Não nasci em Jaú, mas passava grande parte de todas as férias nessa cidade tão querida.
E porque as lembranças da minha infância são infinitas e deliciosas, há tempos escrevi uma crônica sobre elas.
Como Jaú aparece muito em seu contexto e pode também ativar a memória de alguns jauenses, resolvi enviá-la para o blog.
Um abraço a todos e até dia 12!
Iza."

Belezas da minha infância
Maria Luiza de Almeida Prado Luna Freire

"Se há uma pessoa que possa, a qualquer momento, arrancar da
sua infância uma recordação maravilhosa, essa pessoa sou eu."
Cecília Meirelles
Também eu, a qualquer instante me transporto às belezas da minha infância. Recordo estrelas que pensava serem os olhos dos santos nos olhando. Casas sempre abertas, claras, iluminadas... a preta querida – tão querida! -Ah, dona Ismênia! - contando histórias dos meus antepassados ao pé da minha cama ou - entre tantas outras lembranças que ela deixou em mim - abrindo a garrafa de guaraná, depois de tê-la sacudido, para comemorarmos a chegada do ano novo. O quarador de roupas da casa da minha avó Esther... o viveiro – tão grande para o meu tamanho tão pequeno! – cheio de pássaros coloridos e cantantes, no qual meu tio Vadô entrava e me deixava maravilhada de tanta coragem! Os quartinhos do fundo da casa da minha avó, em Jaú, tão cheios de histórias de minha mãe pequena, histórias algumas vezes contadas, mas sempre misteriosamente fantasiadas por mim, tão criança... tão precocemente sonhadora! Recordo fazendas de café com os "infindáveis" morrinhos que faziam o carro subir e descer encantadoramente pelo caminho que levava à sede. O abacate amassado na própria casca, pela babá Laura - baiana, brava, querida – e consumido em cima do abacateiro; o abacate que, embora não combinasse com meu paladar, magicamente se transformava no néctar dos deuses gregos, tão absolutamente desconhecidos pela inculta inocência de mim criança. O fogão à lenha do qual costumava me esquivar amedrontada. A "paixão" pelo sobrinho do padre da igreja matriz de Jaú - primeiro namorado?? - que arrancava risos da vovó Esther e broncas amorosas de minha tia Vera; o anel que ele me deu que era ouro e não se quebrou; o anel (sabiamente!) por minha tia devolvido, mas nunca removido da então ainda pequena alma romântica que atravessa comigo os anos. Os carnavais; eu boneca, eu havaiana, eu baiana, eu cigana, eu melindrosa no Jaú Clube...; a hepatite no carnaval que me impediu de ir à Jaú! As marchas carnavalescas chegando do clube Pinheiros até a minha cama; a tristeza por não poder participar daquela matinê; o carnaval de 1959; a hepatite que tocou o coração do meu pai e, carregada até o carro com a fantasia de melindrosa do ano anterior fomos, eu e ele, para o corso da Avenida Brasil; a alegria por ter um pai que não me queria triste. As nuvens brancas, lá em cima, que mudavam de formato; as horas passadas deitada no chão olhando as nuvens se tornarem elefantes, navios, véus de noiva e toda sorte de imagens imaginadas na minha imaginação sem fim. Recordo os passeios de bicicleta, o vento em meu corpo, em meu rosto, em minha alma, me levando a voar para onde ele começa (onde será que o vento começa? – na minha bicicleta eu sabia -). A careta desenhada com carvão no quintal da casa da vovó Esther para chamar o sol em dias nublados, ou o ovo para "Santa Clara clarear, São Domingos alumiar...vai chuva, vem sol...". A correria em disparada depois de ter mexido com a "Guilhermina duzentão, cada passo um quarteirão" com a própria tentando nos alcançar; O bom dia ao "Dito Muié" segurando o ataque de riso por seu rosto, todo empoado de farinha; O tanque – tão alto!- do apartamento se São Paulo de minha avó Alzira e minha tia-avó – ah, Tica, tão querida Tica!- no qual eu lavava (?) roupas (?) em cima de um banquinho; as balas de côco em tiras que eu ajudava a Tica a cortar; o relógio cuco do corredor do apartamento (por onde andará o relógio cuco do apartamento da minha avó Alzira e minha tão amada Tica?); a cama da Tica na qual meu sono puro de criança era aquecido pelo calor-amor de seus braços me abraçando. As festas de aniversário, tão carinhosamente preparadas por minha mãe; os bolos das festas de aniversário que só as mãos da Tica sabiam fazer. E os canudinhos de côco diretamente "importados" de Jaú. Os pesadelos durante as madrugadas que iam embora para longe, muito longe quando minha mãe milagrosamente aparecia e eu voltava a dormir segura. A estátua do menino fazendo xixi escondida entre as plantas do jardim de baixo. Que aventura era se esconder entre as plantas para ver a estátua fazer xixi! A estátua sem braço da pracinha Morungaba. O jogo de ping-pong na enorme mesa da sacristia da igreja São José enquanto a missa não começava; as asas de anjo em minhas costas que me levitavam nas procissões e me elevavam realmente a essa categoria quando subia as escadas da Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio e jogava as pétalas de rosas em respeito profundo a Nossa Senhora que subia em andor; as missas na Igreja São José em São Paulo, do sem paciência e amoroso Cônego Eugênio; a procura das duas queridas cabecinhas grisalhas na missa; o encontro e a caminhada juntas para o almoço dominical na casa da minha tia – tão especial tia! – Zi. A perua DKV dirigida por minha tia-alegria, Tatá, chegando no dia das crianças, cheia de presentes. As mãos de fada da Maria Cândida fazendo o vestido da minha primeira comunhão; o meu "vestido de noiva" da minha primeira comunhão! A viagem de avião até Recife; a rede do terraço da casa alugada de Recife, pra lá de Boa Viagem (como era mesmo o nome da praia que ficava pra lá de Boa Viagem?). A rede ia alto, muito alto, quase tão alto quanto meus sonhos. Os botos. Os botos nadando na beirinha da praia e eu sentada na areia olhando-os entre maravilhada e amedrontada, esperando a hora deles irem embora e chegar a minha vez de entrar no mar. O mar. O Guarujá. O meu pai parado, olhando para mim da mureta que separava a calçada da praia, chegando de surpresa de Manaus. A minha alegria ao vê-lo. A corrida pela areia quente para o abraço compensador pelas saudades e pés queimados. As histórias dos seringais do Amazonas da vovó Alzira (será que algum dia eu ainda consigo chegar até lá?). A casinha de bonecas. Os meus irmãos e primos, cúmplices de tanta infância!
Recordo estufas perfumadas; bocas-de-leão arrumadas no vaso da sala de visitas; roseiras que abrigavam nossos umbigos quando caiam, para dar sorte; amores-perfeitos se mesclando entre os canteiros das casas de amores da Rua Paissandu e da Rua Antonio José da Silva ...
Também eu arranco recordações maravilhosas da minha infância. Também eu guardo dentro de mim as magias e encantos de mim criança. Perpetuadas na minha alma. Inextinguíveis. (1993)

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